Foto: A ativista Miriam Morata Novaes (ao centro) junto com as participantes da Oficina Mulheres da Paz. Foto: Acervo Pessoal
Na estreia da coluna Movimento em foco, a conversa foi com Miriam Morata Novaes, idealizadora e coordenadora dos movimentos Cuida de mim – Alguém que eu amo tem Alzheimer e Recriar.Com.Você.
Além de contar um pouco mais da sua história na entrevista com o jornalista e pesquisador Bruno Cesar Dias, Miriam contribuiu com dicas e sugestões para a equipe e todas as pessoas que acreditam no potencial de mobilização e comunicação do MapaMovSaúde. Destaca a pauta do envelhecimento saudável e da saúde da pessoa idosa como assuntos relevantes para ganhar visibilidade em nossa plataforma.
Leia a publicação da entrevista:
“Pontes levam para todo o mundo, para todo lugar, permitem trocar e aprender” – Miriam Morata.
Por Bruno C. Dias
A arquiteta Miriam Morata Novaes viu sua vida tomar novos rumos quando soube do diagnóstico de Alzheimer de seu pai, em 2006 e, posteriormente, de sua mãe. Do susto e da dor iniciais ela encontrou a força para abrir um blog e poder entender a nova realidade em que se encontrava.
Passados quase 20 anos, o Cuida de mim – Alguém que eu amo tem Alzheimer atinge hoje cerca de 500 mil pessoas por mês por meio das plataformas digitais, incluindo o MapaMovSaúde, e conta com grupos de apoio com cerca de 100 mil pessoas, numa rede voluntária que envolve cuidadores, familiares, diferentes profissionais de saúde, do direito, entre outras áreas. Iniciou também o projeto Recriar Ecovilas, que se propõe a construir um conjunto arquitetônico de baixo custo dedicado à terceira idade, cujo modelo de sustentabilidade e envelhecimento ativo seja replicável em mais lugares.
Quando perguntada de onde vem essa vontade de viver e fazer, Miriam Morata Novaes abre um sorriso largo e deixa claro que, se a vivência da doença de seus pais foi um disparador, foi pela arquitetura que ela compreendeu que pensar e agir em saúde é muito maior do que ficar detida nos agravos do corpo e da mente. “Eu sou fã de pontes, entendeu? Pontes levam para todo mundo, para todo lugar, permitem transitar entre uma realidade e outra, trocar e aprender.”
Leia a entrevista.
MapaMovSaúde: A página do Cuida de mim – Alguém que eu amo tem Alzheimer é uma das mais completas hoje da nossa plataforma. Mesmo assim, conte um pouco da sua história e do movimento.
Miriam Morata Novaes: O Cuida de Mim é um grupo de cidadãos que se mobiliza em torno das doenças degenerativas do envelhecimento, especialmente o Alzheimer e outros tipos de demência. Não sou médica, não sou psicóloga e tudo que aprendi sobre o Alzheimer, inicialmente, foi no susto, quando meu pai foi diagnosticado em 2006. Não sabia nem o que era Alzheimer e decidi fazer um blog para ver se alguém poderia me ajudar. Nesses quase vinte anos, descobri que, junto comigo, existem mais de um milhão e meio de pessoas que estão na mesma condição que eu estive, de cuidadora dos seus familiares.
Rapidamente, o blog se tornou uma janela por onde as pessoas podiam se enxergar, se comunicar, trazer uma leveza para a vida uma das outras e dar um significado para o cuidador, porque ele se acha um lixo. O que a gente está sempre tentando falar para essas pessoas é que elas são seres humanos de primeira linha porque cuidam dos seus. Não poderia ter mais qualidades, no sentido da humanidade, do que qualquer outra pessoa desse planeta. O cuidador é um pilar e ele merece respeito.
Das experiências com o Alzheimer do meu pai e depois da minha mãe, produzi três livros e retornei à internet, para a criação de grupos de apoio. Atualmente, temos mais de 100 mil pessoas nos grupos e cerca de 500 mil acessos por mês nas nossas páginas, incluindo agora, nossa página no MapaMovSaúde.
A força do Cuida de mim me inspirou a iniciar o Recriar.com.você. Nessa atual fase desse projeto, estamos atuando na ressignificação da vida de idosos e cuidadores pelo desenvolvimento de conjuntos arquitetônicos de baixo custo e centrados em espaços comunitários, voltados para a população idosa, para que cada pessoa que abraçar a proposta tenha o direito de envelhecer do jeito que ele quiser.
MapaMovSaúde: Como você soube do MapaMovSaúde e o que te chamou a atenção quando você conheceu a plataforma?
Miriam Morata Novaes: Recebo um monte de mensagens por dia, então, não lembro exatamente quem me mandou, mas foi algum ou alguma colega do Conselho do Idoso, dizendo para eu conferir, por se tratar de uma iniciativa muito interessante.
Para mim, não importa qual é o objetivo na cabeça de quem está criando isso, mas, se dá oportunidade para falar do papel dos cuidadores e debater envelhecimento, é um espaço a ser ocupado.
Quando me aprofundei mais e vi que era uma plataforma com o apoio do governo, entendi que era mais uma porta se abrindo, uma oportunidade de se quebrar uma parede imensa que é o debate do Alzheimer e do envelhecimento e poder mostrar para todo mundo o quanto a gente pode fazer quando se conta com o apoio um do outro.
MapaMovSaúde: Por conta do blog você já tinha certa familiaridade com as ferramentas digitais. Em termos do uso das ferramentas do MapaMovSaúde, o que você acha interessante e o que você acha que precisa melhorar?
Miriam Morata Novaes: Quando comecei a tentar entender, tive um monte de dificuldade, mesmo não sendo totalmente uma analfabeta de tecnologia. Pedi para a Simone, uma amiga e colaboradora do Cuida de Mim que está fazendo o nosso site, para dar uma olhada e ela montou a página. Feito isso, eu comecei a entender e atualmente sou eu que vou lá, acerto o que quero e faço as atualizações.
Talvez, para quem não tem nenhuma noção, a ferramenta possa ser um pouco complicada no início para fazer a página, mas, uma vez aberta, não é difícil alimentar e atualizar. O que eu acho que vocês poderiam fazer é explicar de um jeito muito simples, dentro da própria plataforma, como que as pessoas devem fazer para montar e atualizar a página. Importante também é estimular a divulgação pelo boca a boca.
MapaMovSaúde: Fale mais sobre isso.
Miriam Morata Novaes: É fundamental pedir para que as pessoas que participam do MapaMovSaúde divulguem nas redes tanto as suas páginas como o tutorial. Percebo que as pessoas ainda não divulgam o Mapa nos seus grupos, ficam esperando as coisas acontecerem, e não pode ser assim. Então, quando vou divulgar o meu trabalho, eu coloco junto as informações do tutorial, pois assim falo do Cuida de Mim, do Recriar e apresento o MapaMovSaúde. Dessa forma, a pessoa que nunca entrou lá já está com as informações completas, vai poder ver o que os movimentos têm para oferecer e, se tiver uma dúvida, já vai ter o tutorial para clicar. São coisas simples, e tem muita gente que precisa do MapaMovSaúde e das informações que estão nas nossas páginas e nas dos outros movimentos.
MapaMovSaúde: Para encerrar, em termos de mobilização social, o que você espera da nossa plataforma?
Miriam Morata Novaes: É fundamental que a gente fale mais em idadismo, envelhecimento saudável, envelhecimento ativo. Que a gente consiga ouvir as demandas de todas as etapas da vida, entender e valorizar que as pessoas sejam diferentes. Não podemos mais nivelar os projetos de vida dos velhos e das velhas, passar uma régua e achar que todo velhinho vai ficar bonzinho, com uma mantinha no colo ou jogando dominó na praça esperando a morte chegar.
Eu jamais esperei a sorte chegar. Eu sempre fui e agarrei a sorte e, assim como eu, há diversos homens e mulheres com uma vida inteira de lutas, ocupando cargos e papéis de liderança e que não se enquadram nessa imagem que vendem da terceira idade.
Então, é responsabilidade de todos os envolvidos com os debates sobre envelhecimento saudável e saúde da pessoa idosa permitir que as pessoas continuem sendo o que elas sempre foram. Porque quando você não vive como gostaria, de acordo com a sua realidade interna, você desiste de viver e adoece. Se a gente tira esse direito das pessoas ao envelhecer, elas não aguentam, vão definhando, minguando e morrem antes. Para mim, cuidar da saúde é, principalmente, permitir que as pessoas brilhem. E elas só brilham se forem o que elas quiserem.